Sandra Bastos
Ana Beatriz Menezes foi laureada com o 1º Prémio, Categoria B, no Concurso Internacional de Jovens Intérpretes de Chieri, em Itália, no passado mês de Novembro. Um prémio que envolveu um grande investimento pessoal: “horas de estudo, recitais de preparação para as provas, aulas de instrumento vocacionadas para as peças a executar no concurso, entre outros. Significou não só uma recompensa, mas também uma etapa atingida”. O esforço valeu a pena: “Foi um sinal de reconhecimento para comigo mesma por todo esse esforço, o que me deixou uma sensação de grande satisfação pessoal e vontade de continuar a investir na música”.
“a chave para o sucesso reside na nossa capacidade de sermos convincentes”
Qual é a receita mágica para se vencer um concurso internacional? “Não há nenhum segredo especial para conquistar um prémio. No entanto, para mim, a chave para o sucesso da boa performance reside na nossa capacidade de sermos convincentes”, explica Ana Beatriz.
E “não basta pensar em sê-lo e mostrá-lo; por trás desse pensamento já tem que estar um trabalho sólido, bem delineado, em que a pressão e dificuldade são distribuídas ao longo do tempo, para que, quando chegada a hora de tocar, a performance possa decorrer sem pressões adicionais e que a música possa fazer-se com certeza e fluidez”.
A solo com a Sinfonietta de Chieri
A vitória no Concurso de Itália também trouxe a oportunidade de tocar a solo com a Sinfonietta de Chieri: “Foi a primeira vez que toquei com uma orquestra estrangeira. A Sinfonietta de Chieri é um agrupamento já com alguma experiência, facto que se evidenciou quando comecei a ouvir os primeiros compassos do Concerto nº2 de Mozart para Trompa e Orquestra”. Uma experiência marcantes: “Tanto os ensaios como o concerto foram uma experiência bastante enriquecedora, repleta de boa disposição e boa música, em que a troca de ideias musicais acontecia de parte a parte. Foi uma excelente experiência. Gostei muito”.
“Sinto-me com mais energia e alento para aprender sempre cada vez mais”
Para Ana Beatriz Menezes este concurso incluía-se num conjunto de etapas delineadas para este ano, tais como concorrer a orquestras profissionais, orquestras de jovens, outros concursos do mesmo género e fazer recitais. Esta “conquista” “alimentou ainda mais a vontade de concretizar essas etapas”.
Seguem-se outras etapas, sempre com os pés bem assentes na terra: “Sinto-me com mais energia e alento para terminar o mestrado que estou a fazer e aprender sempre cada vez mais. No entanto, mantenho a consciência de que apesar de ter sido bem-sucedida nesta competição, surgirão certamente momentos de “menor felicidade“. Esse é um pensamento que mantenho sempre comigo, uma vez que me ajuda a aceitar melhor os insucessos”.
“Fazemos as coisas com qualidade, muito bem. Temos boas condições para competir”
O concurso Chieri International Music Competiton já tem um historial de portugueses premiados admirável como Vergílio Oliveira (fagote), Samuel Bastos (oboé), João Barroso (oboé), Tiago Coimbra (oboé), Filipe Fonseca (saxofone), Ana Faria (saxofone), Tânia Gonçalves (saxofone), Sara Martins (saxofone), Eugénia Ribeiro (saxofone), José de Sousa (saxofone), Pedro Matos (saxofone), António Oliveira (saxofone), e Ventos Novos, Ventos do Mar (Música de Câmara). A edição de 2013 também galardoou Hristo Goleminov, aluno da Escola Profissional de Música de Espinho, da classe do professor Gilberto Bernardes, com o Primeiro Prémio, categoria A.
“Penso que, actualmente, com a ida de cada vez mais músicos portugueses a concursos internacionais, temos a noção do que de bom se faz e interpreta em Portugal. A música em Portugal teve e continua a ter, na actualidade, muito bons compositores e muito bons intérpretes. Temos muito boas escolas, muito bons professores. Fazemos as coisas com qualidade, muito bem. Temos boas condições para competir. Basta arriscar e assumirmo-nos ao lado dos outros”, sublinha a jovem trompista.
“as ofertas de trabalho são cada vez mais escassas”
Ana Beatriz Menezes tem acompanhado o panorama da trompa em Portugal na última década: “existem cada vez mais trompistas, quer estudantes, quer licenciados, mais incentivos à prática do instrumento, festivais, masterclasses, entre outros”. Porém, existe o reverso da medalha: “as ofertas de trabalho são cada vez mais escassas, o que tem originado a saída crescente de muito bons músicos portugueses do país. Apesar das boas iniciativas musicais que vão surgindo, esta é uma realidade muito difícil de combater”.
“No meu ponto de vista é óptimo conhecer novas culturas, interagir com músicos de outras nacionalidades e partilhar diferentes visões da música. No entanto, por outro lado, é uma opção que inviabiliza a nossa contribuição para o enriquecimento da música a nível nacional”, acrescenta.
“É necessário aprender a retirar ilações positivas dos próprios erros”
Ainda jovem, em início de carreira, deixa alguns conselhos aos ainda mais novos: “nunca devemos perder a perseverança. Aceitar os erros e insucessos faz parte do processo. É necessário aprender a retirar ilações positivas dos próprios erros. Existe sempre algo a aprender, não só com as más, mas também com as boas experiências. Contudo, sugiro aos estudantes de trompa que oiçam muita música, especialmente ao vivo. Oiçam não só música clássica ou de trompa mas sim música de todos os géneros”.
Arriscar poder fazer a diferença: “arriscar nem sempre significa “atirarmo-nos de cabeça”. Arriscar é tomar a decisão de trabalhar aquela peça que nos cria desconforto porque não sabemos se vamos conseguir. Dando pequenos passos podemos conquistar uma longa distância. E, mais tarde, ao olhamos para trás, ficamos surpreendidos com o que percorremos”. E, claro, “tocar trompa com musicalidade e com qualidade”.
Outro dos caminhos apontados por Ana Beatriz é a participação em masterclasses e concursos: “ajuda muito a crescer, não só em termos musicais, mas também em termos pessoais. Esse hábito faz de nós pessoas cada vez mais fortes. Através dessas experiências aprendemos essencialmente a lidar com a pressão, a concorrência e os nervos, o que nos ajudará no futuro durante a performance”.
Começou a estudar música com 5 anos no Conservatório de Música Jaime Chavinha, em Minde, de onde é natural. Antes de escolher a trompa aos 11 anos, quando decidiu entrar na Banda da Sociedade Musical Mindense, aprendeu violino. O maestro da banda, João Carlos Roque Gameiro, foi o primeiro professor.
Após algum tempo de indecisão e apoio de alguns professores, o professor de música de câmara (Hélder Gonçalves), família e amigos próximos, chegou à conclusão de que a trompa a fazia “sentir verdadeiramente feliz”. A partir desse dia dedicou-se por completo ao instrumento, com o objectivo de tocar cada vez melhor.
Fez a licenciatura na ESML, onde trabalhou com Jonathan Luxton e Paulo Guerreiro, “dois excelentes professores” que marcaram profundamente o seu percurso musical. Foi também na ESML que integrou o quarteto de trompas “TAGG QUARTET”, um grupo inicialmente criado para fins da disciplina de música de câmara, mas que se tornou “um projecto interessante que deu muito bons frutos; criaram-se laços fortes e fez-se boa música”.