Sandra Bastos
“Difícil de transmitir aquilo que significa para mim mas fácil de explicar o que significa para NÒS. O projecto Banda Sinfónica Portuguesa (BSP) tem conseguido, com todo o mérito, desenvolver-se graças a todas as pessoas que nele participam”, sublinha Nelson Silva, trompista da BSP. Foi à procura desse NÓS que a Da Capo falou com Nelson Silva, Crispim Luz (concertino), Isabel Anjo (saxofonista) e, claro, com o fundador e director artístico, Francisco Ferreira.
“A BSP é uma autêntica orquestra, com músicos profissionais de topo, qualidade fantástica, com repertórios inovadores, que foram escritos para serem tocados em grandes salas de concerto”, explica Francisco Ferreira.
Isabel Anjo confirma que “é um projecto único, que se tem revelado de extrema importância na dinâmica da música erudita do nosso país, onde os músicos têm oportunidade de fazer música com elevada qualidade; em palcos de grande relevância, com maestros de referência, participando com grande sucesso em importantes concursos internacionais de música”. “É a oportunidade de poder fazer música com elevada qualidade vivendo cada concerto como se fosse o último”, acrescenta Crispim Luz.
“O segredo está em cada um de nós dar o máximo quando estamos juntos”
Nelson Silva sente-se orgulhoso em “fazer parte de um grupo de trabalho com pessoas tão talentosas quanto empenhadas para que este projecto continue. O segredo está em cada um de nós dar o máximo quando estamos juntos. É uma mescla entre um grupo de amigos e um grupo de trabalho. São duas conjugações que não deixam indiferente cada pessoa que nos ouve”.
E será a magia dessa união que conquista o público: “Em cada actuação estará envolvido muito empenho, dedicação, rigor e paixão. São esses sentimentos que fazem de nós aquilo que o público ouve”.
“recebemos muitos elogios, palavras muito simpáticas de muitas entidades”
Maestros internacionalmente reputados como Jan Cober, Douglas Bostock, José Rafael Vilaplana, Alex Schillings e Eugene Corporon dirigiram a BSP com enorme sucesso, tendo considerado este projecto como “extraordinário e de uma riqueza cultural enorme para Portugal. Em Abril de 2008, foi distinguida com o 1º prémio no II Concurso Internacional de Bandas de La Sénia na Catalunha (Espanha) na 1ª secção e igualmente o 1º prémio na categoria superior (Concert Division) do 60º aniversário do World Music Contest em kerkrade na Holanda em Outubro de 2011, com a mais alta classificação alguma vez atribuída em todas as edições deste concurso que é considerado o “campeonato do mundo de bandas”.
“Do ponto de vista da crítica, tem sido muito positiva, recebemos muitos elogios, palavras muito simpáticas de muitas entidades, temos muitos músicos que nos enviam propostas para tocarem a solo connosco, gravar discos… desse lado é fantástico”, conta o director artístico.
“se não conseguirmos ter um orçamento muito mais elevado, não poderemos passar daquilo que estamos a fazer…”
O problema está no apoio financeiro: “somos uma estrutura que envolve muitas pessoas, muitos músicos, que tem um background ao nível técnico de produção muito simples, é uma estrutura que não tem um único funcionário com contrato de trabalho, todos colaboram em prestação de serviços, baixo custo, low cost, e com um trabalho que é reconhecido por todos”.
Não obstante o apoio que recebeu da Direcção-Geral das Artes, a BSP precisa de mais: “Temos de ter um orçamento muito mais elevado para outro tipo de ambições, ao nível da profissionalização, ou seja, fazer com que as pessoas se dediquem mais a este projecto, parte da sua vida profissional, durante a semana. É óbvio que depois isto vai acarretar uma estrutura técnica de produção e gestão que é necessária mas já sabemos que tudo está interligado – se não conseguirmos ter um orçamento muito mais elevado, não poderemos passar daquilo que estamos a fazer…”
“levamos o nome Portugal à China e não conseguimos levar o nome Banda Sinfónica Portuguesa pelo nosso Portugal fora”
Nelson Silva admite que “a BSP, devido aos poucos recursos financeiros, tem de gerir muito bem o que lhe é possível conseguir e, nesse aspecto, faz com que todos os projectos que organiza tenham bastante importância”.
Cada projecto é, assim, a concretização de um sonho: “A única coisa que parece existir entre nós é o sonho. É com esse sonho que nos temos alimentado todos estes anos que passaram. Foi a sonhar que alcançamos primeiros prémios em concursos, promovemos iniciativas, organizamos cursos e concursos, realizamos concertos aqui e além-fronteiras”.
Lamenta a falta de reconhecimento a nível nacional: “Continuamos a investir em nós, na música, na cultura e no país, sem que esse país nos retribua tudo o que por ele fazemos. Tenho pena que levemos o nome Portugal à China e que não conseguimos levar o nome Banda Sinfónica Portuguesa pelo nosso Portugal fora”.
“Continua a ser um projecto sem retorno financeiro para nós músicos”
Francisco Ferreira adverte que os músicos estão a atingir o limite: “todos nós, 90 por cento dos músicos vão dar aulas para os conservatórios, escolas profissionais, academias, quase todos são professores, porque o ensino é a única saída profissional que lhe resta, ainda. Temos de continuar este trabalho que estamos a fazer, e acredito que estamos a fazê-lo no limite, eu sinto, eu vejo os músicos…”
Sendo a BSP constituída por profissionais de música, Isabel Anjo gostaria que a BSP pudesse vir a adquirir estatuto profissional. “É um projecto único no nosso país e direi mesmo no contexto internacional e tem ainda, a meu ver, ao nível da interpretação, um traço identitário marcadamente português, que a torna consistente e distinta”.
“Continua a ser um projecto sem retorno financeiro para nós músicos. Por isso, com muita pena minha, as expectativas futuras são poucas, para não dizer nenhumas. Continuaremos a trabalhar com empenho, dedicação, rigor e paixão até que um dia o Sonho possa ser realidade”, revela Nelson Silva.
"acredito que seremos uma referência a nível internacional”
“Gostava que este grupo tivesse a projecção nacional que realmente merece, pois acredito que marcaremos uma época e seremos uma referência a nível internacional”, confessa Crispim Luz. E também Isabel Anjo: “Gostaria que a BSP tivesse uma agenda de concertos que englobasse apresentações em importantes salas de espectáculos, tanto no nosso país como no exterior”.
Os desejos que o director artístico gostaria que sensibilizassem as instituições políticas: “basta ver como os políticos olham para a cultura”. Nunca foram recebidos pelo anterior presidente da Câmara Municipal do Porto que, aliás, nunca assistiu a nenhum concerto, apesar da BSP estar sediada no Porto, desde a sua fundação em Novembro de 2004. Esperam, agora, uma resposta de Rui Moreira que, pelo menos, já ouviu a BSP em concerto.
“A solução seria criar mais duas ou três orquestras, apostar na cultura, fazer com que tiremos partido dos nossos recursos humanos e ter um trabalho de excelência no nosso país, quer ao nível de orquestras, de ensino, de tantas áreas”, aponta.
“A nossa expectativa é que a BSP se torne uma verdadeira estrutura profissional a tempo inteiro”
Mais do que nunca, o sonho comanda a vida: “estamos aqui de corpo e alma para continuar a trabalhar e sustentar esta associação. Temo-lo feito com muita dedicação, vamos ver até quando porque as forças também se esgotam. As pessoas trabalharem de manhã, de tarde e depois ainda terem disponibilidade de forma muito frequente para ensaios à noite isso cria algum desgaste”.
“A nossa expectativa continua a ser mesma, que eu falei desde a primeira hora, que é fazer com que a BSP se torne uma verdadeira estrutura profissional a tempo inteiro”, salienta Francisco Ferreira.
Sérgio Carolino mostra-se “um fã confesso deste projecto”
Convidado com frequência para tocar a solo com a BSP, o tubista Sérgio Carolino é, acima de tudo, “um fã confesso deste projecto”, que considera ser “de extrema importância” para Portugal. “É, na minha modesta opinião, o melhor ensemble de sopros e percussão que alguma vez ouvi e/ou toquei a nível mundial. Deve ser acarinhado e apoiado por todos os portugueses, muito em particular pelo estado português e por que não, por várias entidades privadas”, afirma.
Tem, assim, expectativas muito altas em relação à BSP: “estamos a falar sobre um ensemble de topo mundial Gostaria de ver a BSP a fazer tournées um pouco por todo o globo e nos principais festivais de música”.
E explica qual o caminho: “alterar o nome para Orquestra Portuguesa de Sopros – Portuguese Wind Orchestra; arranjar patrocinadores estatais e privados, que suportem todas as necessidades do projecto, o qual necessita por exemplo de uma sala de ensaio, que seja o seu local de residência e onde tenha todas as condições para poder trabalhar ao mais alto nível artístico; uma boa equipa de produção e sobretudo uma equipa de marketing que saiba “vender” o produto a nível internacional; um website bem construído com toda a informação actualizada em português e em inglês, sobre o ensemble, os seus membros, directores, maestros e solistas convidados, vídeos, entrevistas, recortes da imprensa, entre muitas outras coisas...”
Francisco Ferreira, o fundador
Entre muitas outras coisas, com uma carreira multidisciplinar, Francisco Ferreira fundou a BSP, é professor de saxofone e coordenador do departamento de sopros e percussão do Conservatório de Música do Porto, acumulando funções como Director Pedagógico na Academia de Música de Costa Cabral – Porto. É ainda membro fundador do Quarteto de Saxofones do Porto e, paralelamente à sua carreira artística, licenciou-se em Direito em 1994 pela Universidade Católica Portuguesa. “Deus também está comigo, sou uma pessoa de fé, tenho tido o apoio da família, serão algumas facilidades do ser humano, trabalho muito, quando consigo ter um bocadinho de espaço tempo livre ainda penso que poderia ter feito mais”, diz.
“A BSP foi um bocadinho isto – nascemos com muitos sonhos mas quando caímos na realidade as coisas não são como nós as sonhamos. É quase como educar uma criança, que tem de ir educando, com acompanhamento muito próximo, há crianças que se conseguem desenvolver mais do que outras, independentemente do acompanhamento que tiverem”, acrescenta.