Sandra Bastos
Beatriz Patrocínio venceu o Prémio Jovens Músicos (PJM) em Canto, no ano passado (2024). Da exigente preparação para as provas até ao emotivo Concerto dos Laureados com a Orquestra Gulbenkian, a jovem cantora conta-nos como o PJM impulsionou a sua carreira e como está a fazê-la crescer profissionalmente.
Começou a estudar violino com 10 anos de idade, “por mera curiosidade e pela oportunidade de aprender algo novo”. Escolheu o Canto quando estava no 10º ano de escolaridade, mas sem a certeza de que seria a sua opção de vida. “Quis “ver onde dava” e, se me apercebesse de que não era aquele o caminho, voltaria atrás um ano e começaria os estudos noutra área diferente. Ainda bem que arrisquei”, diz.
Decidiu concorrer ao PJM, “pelo prestígio principalmente pelo prestígio deste concurso a nível” e porque considera que os “os concursos são uma ótima oportunidade de colocar” o seu instrumento “à prova” e de, “sobretudo, aprender e ganhar experiência performativa”.
“Para confiar no meu trabalho tenho, de facto, de trabalhar”
A preparação para as provas exigiu muito trabalho e confiança. “Para me sentir confortável em palco e evitar ao máximo o nervosismo, devo confiar no meu trabalho. Para confiar no meu trabalho tenho, de facto, de trabalhar. E esse trabalho passa por, depois de ter as notas e ritmo sabidos, dar muita atenção ao texto e tradução de cada canção ou ária”, explica.
Tendo em conta que “os cantores não podem praticar horas e horas a fio como um Instrumentista”, Beatriz procura compensar e no “trabalho de secretária”, criando a sua própria interpretação das obras. “A partir do momento em que percebemos o contexto em que a obra foi escrita bem como a maneira de escrever do próprio compositor, a parte da técnica vocal torna-se mais fácil”, sublinha.
A emoção do Concerto dos Laureados
Os meses que antecedem as provas são, para a jovem cantora, os momentos mais difíceis devido ao “muito rigor e disciplina” necessários na preparação do repertório. “Só assim conseguimos desfrutar verdadeiramente do que fazemos em palco e abstrairmo-nos do que poderá acontecer depois”, afirma. Exemplo disso foi a prova final, em Guimarães, em que saiu feliz do palco, porque sabia que “tinha entregado uma performance digna de uma final de um Prémio Jovens Músicos”.
Porém, o momento mais emocionante foi o Concerto dos Laureados com a Orquestra Gulbenkian. “Pelas razões óbvias, é um concerto que ficará para sempre na minha memória. Até à data de hoje ainda não consegui encontrar palavras para descrever o que vivi naquele palco”, confessa.
“um jovem artista precisa de oportunidades boas e justas para trilhar o seu caminho”
Acredita que o PJM será “uma grande rampa de lançamento” para o seu trabalho: “Para além da diversidade dos prémios que nos são atribuídos, o prestígio deste concurso permite-nos ter muito boas oportunidades nos “pós concurso”. “
“Estou muito grata a toda a equipa que fez e faz este concurso “acontecer” porque sinto que mais do que dizer que conquistei o 1º lugar, eu estou de facto a preparar concertos e a traçar objetivos definidos. E um jovem artista precisa justamente disso, de oportunidades boas e justas para trilhar o seu caminho”, acrescenta.
A ópera na ESMAE e o final de mestrado
Na sua ainda curta carreira, destaca, além da sua participação no PJM, o recital final de licenciatura na ESMAE e todos os projetos de ópera em que participou: “Foi particularmente especial ter feito parte da produção da ópera “Cosi fan Tutte” de Mozart em abril de 2024, para além de ter sido a última ópera em que participei enquanto aluna da ESMAE, pude partilhar o palco com duas grandes amigas”.
Atualmente, está a preparar a escrever a sua tese de final de mestrado e a preparar o recital. Tem também concertos agendados em Portugal e Espanha até ao final do ano.
A excelente qualidade do ensino de Canto em Portugal
A Beatriz Patrocínio considera que a qualidade do ensino de Canto em Portugal é superior, “em todos os seus níveis”, quando comparada com algumas escolas superiores de música que visitou. No entanto, no nosso país, “as oportunidades de trabalho são poucas, comparadas à quantidade de concertos e produções de ópera que se fazem lá fora”.
Aponta o facto de em Portugal só existir apenas um teatro de ópera, enquanto que só em Berlim existem três. “Perante um cenário como este, é normal que um jovem português não se sinta motivado a seguir os estudos superiores no seu país”, explica. Numa fase inicial, o ensino superior português responde às necessidades dos seus alunos, porém, numa fase mais avançada, é importante “fazer masterclasses ou um mestrado no estrangeiro”, para haver contacto com “novas culturas e formas diferentes de pensar”. Diz ainda que “a música é a melhor forma de o fazer, afinal, é uma linguagem universal, com a qual podemos comunicar em todas as partes do mundo”.
Beatriz Patrocínio
Beatriz Patrocínio é a mais recente vencedora do Prémio Jovens Músicos 2024 e do Prémio Music Series Festivals 2024. Nascida em 2002, é uma soprano portuguesa licenciada em 2023 pela Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo, onde se encontra atualmente a frequentar o Mestrado em Interpretação Artística na classe do professor António Salgado.
É Bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian, fazendo ainda parte do Programa de Bolseiros da Fundação Richard Wagner.
Na ESMAE participou na produção da opereta “Os Noivos” de Francisco de Sá Noronha (2022) e na “Ópera Real” de Telmo Marques, Eugénio Amorim, Carlos Azevedo e Dimitris Andrikopulos (2023). Em Abril de 2024 estreou-se como Fiordiligi e Dorabella (“Cosi Fan Tutte” - W. A. Mozart) no Teatro Helena Sá e Costa.
Participou em masterclasses com Isabel Alcobia, Elisabete Matos, Silvia Munteanu, Alexander Schmaltz, Irene Alfageme, Mario Diaz e Olesya Tutova. Em 2022 foi admitida no “Verão Clássico”, Lisboa, onde trabalhou com a soprano Anna Samuil.
Em Janeiro de 2024 foi escolhida para estar em Maastricht, Países Baixos, nos European Opera Academy Open Days onde trabalhou com os professores Martin Hellström, Fausto Nardi e Willem Wentzel.
Em 2022 recebeu uma menção honrosa no “Prémio Helena Sá e Costa” (ESMAE) e em 2023 ganhou o 1º prémio do “Concurso Setúbal Voz”. Em 2024 venceu o 1º Prémio do Concurso Internacional de Canto do Alto Minho.
Trabalhou com a Orquestra das Beiras, Orquestra Gulbenkian, entre outras. Em março de 2024 foi selecionada para se apresentar na Gala de Ópera do projeto Opera out of Opera no Teatro Helena Sá e Costa com a Orquestra Sinfónica da ESMAE, dirigida pelo maestro Michelangelo Galeati. Através do mesmo projeto esteve, em fevereiro e março de 2025, em Oslo e Salzburgo, onde se estreou como Mimi na ópera “Là Bohème” de Puccini.
Fotos:
SpintoPhotography
Jorge Carmona/Antena 2